Ditada pelo Espírito do Nosso Senhor Jesus, no ano de 1835, na cidade de Avinhão, antiga cidade do sul da França, onde outrora residiam os papas franceses. Quando, no Gólgota se ergueu a cruz supliciadora do divino enviado, completava-se a segunda revelação: estava fundado o Cristianismo. A presente obra encerra a História e a Doutrina da maior figura humana de todos os tempos, constituindo um tão grande tesouro de luzes espirituais, que todos quantos tiveram a felicidade de estudá-la no recolhimento de seus lares, atestam o excepcional progresso espiritual que sua leitura lhes trouxe. Este livro é no dizer de Sebastião Caramuru, o tradutor da edição brasileira, “a mais bela manifestação do gênio através da perfumada flor da mediunidade. Nenhuma outra se lhe aproxima. É ao mesmo tempo um livro de história e um compêndio didático de espiritismo, ensina com segurança os caminhos da espiritualidade e esclarece as páginas, até aqui nebulosas, da passagem de Jesus homem pela face da Terra, onde viveu, amou e sofreu. Tudo o que andava oculto pelo interesse dos homens ou por estes vinha sendo mal explicado, recebe do insigne autor um poderoso jato de luz”.
Quais seriam as maiores controvérsias sobre a vida de Jesus que a Igreja defende e que os historiadores discordam?
O assunto daria um livro, de tantos casos. Por exemplo, na época, os judeus não podiam crucificar ninguém, apenas lapidar. Só romanos crucificavam, e sempre aqueles considerados revolucionários.
Existem determinadas passagens nos evangelhos que são atribuídas à vida de Jesus, mas que também se encontram em narrativas da vida de outros mestres da humanidade. Registre-se que na história de Krishna, 2500 anos antes, ele teria nascido de uma virgem e sido perseguido na infância por um rei que mandara matar todas as crianças, temendo uma em particular. Ou seja, é bem possível que esta e outras passagens sejam míticas e não históricas.
A cidade de Nazaré é de 70 d.C. e é possível que Jesus fosse um "nazarita", designação de facção política, e não nazareno. Os relatos tampouco respeitam distâncias e coerência.
Claramente, aliaram, posteriormente, dados imprecisos sobre a história dos judeus, em um tempo sem imprensa e internet, a mitos conhecidos e frases reais de Jesus. Isso seria até coerente com o estilo da época. O problema é que cada incoerência encontrada por Roma séculos depois deu origem a mutilações e interpretações, criando dogmas que se confundiram com o cristianismo, e posteriormente, com o protestantismo e parte do espiritismo. Entretanto, a fé em Jesus, como um mestre, uma egrégora, sabedoria e espírito de luz - e toda a evolução que já trouxe ao mundo - não precisa depender destes fatos "históricos". Mesmo se o Mestre jamais tivesse encarnado entre nós.
Existe a possibilidade de Jesus ter sido casado com Maria Madalena?
- É altamente provável, especialmente se considerarmos apócrifos bem aceitos por pesquisadores, embora naturalmente rejeitados pelos concílios de Roma. Além do mais, pelas tradições judaicas, ele precisaria ser casado naquela idade. Na cultura do deserto, até hoje seria escandaloso para uma mulher como Madalena andar sempre no meio deles, se não fosse casada com um do grupo. É ela também quem o unge como Messias, no Templo, seguindo a tradição dos reis dali. Há apócrifos que narram os ciúmes de Pedro para com ela, e o mestre a beijando na boca. Mas Jesus sendo Deus, na versão romana, nascido de virgem e sem sexo, não poderia ser casado, segundo a Igreja. A solução de um papa foi interpretar que Madalena seria uma prostituta arrependida. A versão é tão sem fundamento que o próprio Vaticano já a rejeitou, mas muitos de nós ainda pensamos que isso está na Bíblia.
Desde quando essa discussão existe?
Certamente, desde os primeiros tempos do cristianismo. A pergunta a nos fazermos é desde quando o questionamento parou de existir, e a resposta está nos concílios. Posteriormente, as cruzadas e a inquisição deram uma grande “contribuição” para a unificação da versão absolutista de Roma. Neste aspecto, o espiritismo é bastante feliz ao entender Jesus como um grande espírito, e ater-se mais à sabedoria de suas palavras e sua aplicabiluidade do que aos fatos históricos. Infelizmente, tradições equivocadas de nossos credos antigos ainda se sincretizam com várias casas, às vezes endossas por animismos, e precisamos esclarecer e atualizar a doutrina, como ensinava Kardec em suas Obras Póstumas.
Como você, como historiador, analisa O Código Da Vinci?
- É um bom livro de ficção, e não de história - e, por isso, comete imprecisões. Entendo que mais acerta do que erra, e seu maior mérito é incentivar o questionamento e pesquisa. Seu enredo baseia-se em livros de pesquisadores sérios e as pesquisas e evangelhos apócrifos que estes questionam não são ficção.
sobre O Evangelho de Judas? Qual é a sua opinião?
- As revelações não são novas, e não nos surpreendem. Apócrifos originais, bem menos adulterados do que a Bíblia que temos, vem sendo encontrados há décadas no Egito e no Mar Morto. Seus textos já nos mostravam o papel de Judas como executor do plano de Jesus, a pedido do próprio. Não é por acaso que no filme A Última Tentação de Cristo ele é visto exatamente como agora comprovamos: estes conteúdos já eram da ciência de boa parte de pesquisadores, ocultistas, maçons e rosa-cruzes. Hoje, podemos revelar que estes eram alguns dos grandes segredos que geravam perseguição e injustiças, particularmente da Igreja, contra estas ordens.
A bem da verdade, uma leitura cuidadosa dos próprios evangelhos canônicos (oficiais) já deixa claro que a "traição" de Judas havia sido escolhida e anunciada pelo próprio Mestre, que o ordena a cumprir seu papel. Mesmo na Bíblia, Jesus anunciava que reproduzia certos fatos "para que se cumprissem as profecias". Entrar em Jerusalem em um burrico, ser "traído" por um discípulo, ter descendência de David e ser ungido no templo eram sinais, para o povo, de que aquele seria o Salvador anunciado pelos profetas.
Quem teria sido Judas, então?
- Mesmo na Bíblia oficial, evangelistas apontam Judas e Tiago como nome de irmãos de Jesus. Pela tradição que agora cai por terra, as pessoas pensavam haver dois Judas: um traidor, arquetípico; e outro bom, que escreve o penúltimo livro da Bíblia com o nome de Judas Tomé, ou Judas Dídimo. A tradição fala de um apóstolo "Tomé", mas isto é um título e não um nome: é a palavra hebraica para "irmão gêmeo". E confirmando isso, "dídimo" é a palavra grega para gêmeo. Os evangelhos que conhecemos foram escritos em grego, após a destruição de Jerusalem.
Já o título "iscariotes", para muitos, vem de "sicário", portadores de punhal, uma facção revolucionária da época, da qual Simão "Pedro" (palavra grega para rocha, pedra, "durão") faria parte. Portanto, Iscariotes, Tomé e Dídimo são provavelmente alcunhas para Judas, irmão de Jesus, e discípulo fiel. E se Judas era irmão como a Bíblia afirma, pelo idioma seria um irmão gêmeo de Jesus, o que na época era visto como mais um sinal de Deus.
Segundo vários autores, baseados nos Atos dos Apóstolos e pesquisas, Judas teria ido para o oriente. Um profeta conhecido lá como Issa, possuia um discurso parecido com o de Jesus. Se era gêmeo, isso explica porque certos pesquisadores - e o próprio Alcorão - sustentam a tese de que Jesus teria sobrevivido à cruz e vivido na Índia. Os estudos não são conclusivos, mas aparentemente ele ou seu irmão (gêmeo?) viveram e pregaram lá. No Alcorão, livro sagrado dos muçulmanos, Jesus é respeitado como um grande "profeta" - e não o próprio Deus, como na versão da Igreja de Roma.
Você acha que precisamos humanizar mais Jesus, sem deixarmos de valorizar seus ensinamentos?
- Sim, mas entendo que o verdadeiro espiritismo sempre fez isso. As palavras originais de Jesus (Fonte "Q") falam de sabedoria e espiritualidade, e nunca da religião e pseudo-história acrescentada depois. Esta sabedoria sobreviveu às adulterações da Bíblia, e foi este lado que Kardec e interpretou à luz da doutrina. Entendo que se o codificador, universalista como era, vivesse na Índia, teria escrito o "Baghavad Gitá Segundo O Espiritismo", e estaria mais interessado na essência da sabedoria de Krishna do que em discutir se este tinha pele branca ou azul.
Não é culpa do espiritismo em si, mas algumas pessoas confundem o dogma católico que aprenderam na infância com a essência de Deus, criando em algumas casas um "neo-catolicismo mediúnico reencarnacionista", que também tem sua utilidade evolutiva - e falo isso pensando em minha própria mãe! - mas não pode ser confundido com a própria palavra de Jesus ou de Kardec.
Como é possível mantermos nossa fé após sabermos de tantas controvésias sobre a vida de Jesus?
- A pesquisa precisa haver, para não cairmos em novas mistificações. Já a fé e espiritualidade são conceitos interiores, intransferíveis e inquestionáveis. Filmes assim nos perguntam se o Espírito Crístico que experimentamos está mesmo baseado no coração, ou em alguma história exterior. Aliás, todo alto clero passa por este questionamento, em algum momento de sua carreira.
Entendo que há toda uma egrégora e espiritualidade atuando há séculos, evolutivamente, em nome de Jesus Cristo e sua mensagem. O bem que este movimento faz independe da verdade histórica, ou de erros passados de dirigentes religiosos. Alguns espiritualistas preferem separar o "Jesus" da história, grande homem e médium; de "Cristo", a verdade espiritual que ele nos trouxe. Eu concordo: em todas as religiões, o que se faz em nome de Cristo é bom, e não pode ser afetado pelo que se fez de mentiras em nome de Jesus. Se simples fatos históricos ou ficções policiais abalarem nossa fé, devemos questionar se não havia um dogma eclipsando nossa verdadeira essência espiritual.
A Última Tentação de Cristo
Talvez o mais polêmico filme do célebre Martin Scorcese A Última Tentação de Cristo nos propõe uma instigante re-concepção da vida de Cristo à luz não das suas virtudes divinas, mas das suas inconfessáveis fraquezas humanas.
Considerado herético pela Igreja Católica, A Última Tentação de Cristo (The Last Temptation of Christ, EUA, 1988) permaneceu proibido em diversos países por muitos anos (somente agora, por exemplo, é que a obra deixou de ser proibida no Chile, após 15 anos de censura). O filme, baseado no polêmico best-seller homônimo de Nikos Kazantzakis, nos propõe uma releitura dos acontecimentos da vida de Jesus Cristo, enfatizando a sua natureza dividida e o seu conflito interior entre o messias predestinado por Deus ao sacrifício na cruz e o homem comum e prático que ambiciona constituir família e desfrutar de uma vida serena e tranqüila no mais absoluto anonimato.
Cristo (o ótimo Willem Dafoe, o Duende Verde do primeiro Homem-Aranha) é um marceneiro judeu, responsável pela feitura das cruzes com as quais os romanos crucificam aqueles que se opõem ao seu domínio. Atormentado por pesadelos e visões os quais desconhece o real significado, foge para uma espécie de mosteiro onde, através de uma decisiva e reveladora visão, toma consciência do seu papel como o tão aguardado messias. A partir de então, decide percorrer toda Israel, professando a sua crença em Deus (e em si próprio como o seu emissário direto, em verdadeiros arroubos de orgulho próprio). Acompanhando-o está um grupo de discípulos, dentre os quais Judas (Harvey Keitel, em uma atuação bastante criticada que lhe valeu uma indicação ao "Framboesa de Ouro" de pior ator coadjuvante), grande amigo de Cristo e seu braço direito.
O filme retrata, de maneira única, alguns dos mais célebres eventos do Novo Testamento, como o batismo de Cristo por João Batista, o seu exílio no deserto e a ressurreição de Lázaro. Em todos, vemos um Jesus inseguro, orgulhoso, incerto quanto aos reais desígnios de Deus; enfim, não divino, mas humano. Mais tarde, já na cruz, à beira da morte, Cristo é tentado uma derradeira e decisiva vez a abdicar de sua responsabilidade para com a humanidade e do sacrifício na cruz como o Escolhido e assumir para si a vida de um homem comum, com esposa, filhos e uma perspectiva de envelhecer e morrer como tal...
A partir de então o filme adentra o terreno do que o constitui em sua razão de ser (como o romance no qual se inspirou): a própria última tentação de Cristo. Vemos Cristo se casar com Maria Madalena, ter filhos - e uma amante! - e envelhecer como um homem qualquer. O vemos exultante ante sua nova condição: de fato, jamais ambicionara nada mais do que aquilo que passou a ter desde que, seduzido por um belo anjo, fugiu do sacrifício ao qual estivera destinado.
E, afinal, o consegue. Mas não somente a isto!... Em questão de meros instantes, Cristo novamente se vê crucificado. Novamente tendo de enfrentar o mesmo sacrifício do qual houvera fugido antes. Mas, desta vez, o vemos, irresoluto, decidido a enfrenta-lo. E tudo já lhe parece, então, tão natural que ele até chega a ostentar um breve sorriso um tanto quanto zombeteiro, num misto de satisfação e comodismo de uma pessoa de quem sempre se esperou absoluta divindade, mas que não consegue escapar da sua mera e tão própria humanidade. A seqüência final do filme é brilhante! Afinal, se fomos mesmo criados a imagem e semelhança de Deus, por que "Ele" se furtaria a refletir o que temos de mais particular e humano: a nossa própria natureza conflituosa, posto que comumente somos postos de encontro a convenções ou marcais culturais que nos restringem? De qualquer modo, tanto quanto ser seduzido por um lindo anjo, sem dúvida nos parece muito mais tentadora a releitura proposta por Scorcese e Kazantzakis do que a concepção tradicionalmente acatada, tão destituída de humanidade quanto um autômato.
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