Sobre os aspectos do uso da evocação de Espíritos
Se o Espiritismo é, segundo seu fundador, a ciência que estuda a natureza, a origem, a destinação do espírito, bem como suas relações com o mundo corporal, a mediunidade é o instrumento de observação possível para este estudo.
Allan Kardec escreve na sua obra A Gênese:
“Até ao presente, o estudo do princípio espiritual, compreendido na Metafísica, foi puramente especulativo e teórico. No Espiritismo, é inteiramente experimental. Com o auxílio da faculdade mediúnica, mais desenvolvida presentemente e, sobretudo, generalizada e mais bem estudada, o homem se achou de posse de um novo instrumento de observação. A mediunidade foi, para o mundo espiritual, o que o telescópio foi para o mundo astral e o microscópio para o dos infinitamente pequenos…”
Segundo o espiritismo, os Espíritos podem vir se comunicar conosco de duas maneiras: ou de forma espontânea, ou por evocação (chamamento).
Allan Kardec utilizava-se dessas formas, deixando claro que seria um erro abdicar de qualquer uma delas.
Ao longo de suas obras, percebemos a importância dada à evocação direta dos Espíritos, apesar de toda a pressão do clero romano que insistia em manter a hegemonia em relação ao mundo espiritual.
Visando esclarecer os indivíduos que desejavam manter contato sério com os Espíritos, Allan Kardec publica em 1861 "O Livro dos Médiuns ou guia dos médiuns e dos evocadores". Como o título do livro já diz, é um tratado de mediunidade que serve de manual para os evocadores de Espíritos (os que os chamam) e para os médiuns (os que recebem a influência direta dos Espíritos).
Um capítulo (XXV) é dedicado integralmente à Evocação, deixando claro, já no seu primeiro parágrafo como a evocação permite ter um maior controle das informações obtidas, bem como da identidade dos Espíritos que se comunicam:
"Pensam algumas pessoas que todos devem abster-se de evocar tal ou tal Espírito e ser preferível que se espere aquele que queira comunicar-se. Fundam-se em que, chamando determinado Espírito, não podemos ter a certeza de ser ele quem se apresente, ao passo que aquele que vem espontaneamente, de seu moto próprio, melhor prova a sua identidade, pois que manifesta assim o desejo que tem de se entreter conosco. Em nossa opinião, isso é um erro: primeiramente, porque há sempre em torno de nós Espíritos, as mais das vezes de condição inferior, que outra coisa não querem senão comunicar-se; em segundo lugar e mesmo por esta última razão, não chamar a nenhum em particular é abrir a porta a todos os que queiram entrar. Numa assembléia, não dar a palavra a ninguém é deixá-la livre a toda a gente e sabe-se o que daí resulta. A chamada direta de determinado Espírito constitui um laço entre ele e nós; chamamo-lo pelo nosso desejo e opomos assim uma espécie de barreira aos intrusos. Sem uma chamada direta, um Espírito nenhum motivo terá muitas vezes para vir confabular conosco, a menos que seja o nosso Espírito familiar."
Antes mesmo deste livro ser publicado, O Livro dos Espíritos, em sua primeira edição, já apontava as condições para evocar-se os Espíritos. Além do conhecimento profundo da teoria, a evocação exige seriedade, recolhimento, que tenha como objetivo o interesse geral e que seja feita em nome de Deus.
De forma didática podemos retirar das obras de Allan Kardec três aspectos do uso das evocações:
1º - científico (coleta de dados, elaboração de princípios);
2º - consolador (esclarece sobre para onde nossos "mortos" vão e qual seu estado);
3º - desobsessivo (usada na prevenção da obsessão e na terapia desobsessiva).É útil a evocação?
Assim nos perguntou um dos nossos leitores. Importa, contudo, antes de respondermos negativa ou positivamente, conceituarmos o que significa, para a Doutrina Espírita, o ato da evocação.
Ensina Allan Kardec:
- "[...] Invoca-se Deus pela prece. [...] Toda prece é uma invocação. A invocação está no pensamento; a evocação é um ato. Na invocação, o ser ao qual nos dirigimos nos ouve; na evocação, ele sai do lugar em que estava para vir a nós e manifestar sua presença. A invocação é dirigida somente aos seres que supomos muito elevados para nos assistirem. Evocam-se tanto Espíritos inferiores quanto os superiores.”[1]
Dessa forma, Kardec anota que invocar e evocar não são sinônimos perfeitos. Ao contrário, apresentam particularidades que lhes são próprias. As circunstâncias são as mestras em determinar a necessidade de um ou de outro procedimento.
Convém também aduzir que a obra “Instruções Práticas” fora amplamente revisada, fazendo vir à luz, algum tempo mais tarde, a primeira edição de “O Livro dos Médiuns.
É útil questionar uma coisa apenas: essa distinção entre “evocação” e “invocação” prevaleceu na obra que fundamenta a metodologia espírita, lançada no ano de 1861?
Já em 1864, quando o Codificador do Espiritismo lança o livro O Evangelho Segundo o Espiritismo, o termo invocação é usado no sentido que lhe foi sugerido na obra “Instruções”. Assim aprendemos com a obra que sintetiza a moral espírita cristã:
- “[...] A prece é uma invocação: por ela nos pomos em relação mental com o ser a que nos dirigimos. Ela pode ter por objeto um pedido, um agradecimento ou um louvor. Podemos orar por nós mesmos ou pelos outros, pelos vivos ou pelos mortos. As preces dirigidas a Deus são ouvidas pelos Espíritos encarregados da execução dos seus desígnios; as que são dirigidas aos Bons Espíritos vão também para Deus. Quando oramos para outros seres, e não para Deus, aqueles nos servem apenas de intermediários, de intercessores, porque nada pode ser feito sem a vontade de Deus.”[2]
A invocação consiste, por isso mesmo, em uma espécie de relação mental com o que nos dirigimos. A evocação possibilita a atração do Espírito a quem desejamos falar, tanto quanto sua conseqüente manifestação através da mediunidade.
Ainda esclarece o inolvidável Allan Kardec:
- “[...]Quando, pois, o pensamento se dirige para algum ser, na terra ou no espaço, de encarnado para desencarnado, ou vice-versa, uma corrente fluídica se estabelece de um a outro, transmitindo o pensamento, como o ar transmite o som.[3] [...]Pela prece, o homem atrai o concurso dos Bons Espíritos, que o vêm sustentar nas suas boas resoluções e inspirar-lhe bons pensamentos. Ele adquire assim a força moral necessária para vencer as dificuldades e voltar ao caminho reto, quando dele se afastou; e assim também podem desviar de si os males que atrairia pelas suas próprias faltas. Um homem, por exemplo, sente a sua saúde arruinada pelos excessos que cometeu, e arrasta, até o fim dos seus dias, uma vida de sofrimento. Tem o direito de queixar-se, se não conseguir a cura? Não, porque poderia encontrar na prece a força para resistir às tentações.”[4]
Sobre as evocações, temos outras observações importantes a fazer. Há fatores que devem ser levados em conta para o sucesso das evocações, a saber: a condição moral da pessoa ou do grupo que evoca os Espíritos, o meio onde a evocação é procedida e por fim a finalidade da evocação. Seriedade, fervor e simplicidade são fundamentais para prática das evocações espíritas.
Um dos escolhos dessa prática, como de todas as outras práticas relacionadas ao exercício mediúnico, reside na mistificação e no engodo de Espíritos pouco sérios e, algumas vezes, hipócritas e mentirosos. Esses desejam que seus sistemas e suas idéias sejam aceitos de qualquer maneira, e por isso temem um exame minuncioso das suas informações. Para todos os casos, o conselho preventivo será sempre o mesmo: aplicar-se com severidade os critérios doutrinários já fixados nas obras de Allan Kardec.
Assim aprendemos em O Livro dos Médiuns:
- “[...] Quando se quer comunicar com um espírito determinado, é absolutamente necessário evocá-lo. [...] Quando dizemos que se faça a evocação em nome de Deus entendemos que esta recomendação deve ser tomada a sério e não levianamente. Os que pensarem que se trata de uma fórmula sem conseqüência farão melhor se desistirem de evocar. [...] Podemos evocar todos os espíritos, seja qual for o grau da escala a que pertençam: os bons e os maus, os que deixaram recentemente a vida e os que viveram nas épocas mais distantes, os homens ilustres e os mais obscuros, os nossos parentes, os nossos amigos e os que foram indiferentes. Mas isto não quer dizer que eles sempre queiram ou possam atender ao nosso apelo. Independente da sua própria vontade ou de não terem a permissão de um poder superior, eles podem estar impedidos por motivos que nem sempre podemos conhecer. [...] Em resumo o que acabamos de expor resulta: que a faculdade de evocar todo e qualquer espírito não implica para o espírito a obrigação de estar às nossas ordens; que ele pode atender-nos numa ocasião e noutra não, com um médium ou outro evocador que o agrade e não com outro; quer dizer o que quiser, sem poder ser constrangido a dizer o que não quer; retirar-se quando lhe convém; enfim, que em virtude de sua própria vontade ou não, após haver sido assíduo durante algum tempo, pode subitamente deixar de manifestar-se.”[5]
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