De certo,ninguém vira "anjinho" depois que morre.
Só mesmo no Brasil, em que as lições de Allan Kardec se evaporam como fumaça de água fervendo pelo ar, que as mensagens espirituais se banalizam e estranhamente se submetem a um padrão de misticismo religioso um tanto suspeito.
Recentemente, divulgou-se, na mídia, uma mensagem atribuída ao jovem músico Rafael Mascarenhas, filho do casamento, há tempos desfeito, da atriz Cissa Guimarães e do músico Raul Mascarenhas. Rafael faleceu aos 18 anos, em 2010, atropelado por um automóvel.
O primeiro ponto que precisamos aceitar como verdade é que depois da morte nossa individualidade continua existindo, continuamos com nossa mesma personalidade, nossas conceitos, preconceitos, gostos, qualidades, defeitos, conhecimentos e inteligência. Então,para um jovem que foi skatista e tinha seu jeitão de rebelde comum, como tantos jovens de sua geração, a mensagem atribuída a ele é excessivamente formal e bastante solene, além de estar dotada de um sentimentalismo religioso que não seria típico de sua personalidade.
Cissa é tratada como "senhora", algo que não se acredita que tenha ocorrido em vida. É natural que, em famílias como estas, o filho chamasse a mãe ou o pai de "você", já que se tratam de contextos mais contemporâneos de famílias modernas, de uns 30 anos para cá.
É preocupante que se divulguem mensagens assim, sem qualquer verificação rigorosa de todos os seus aspectos. Vai um e diz que é fulano, e basta a mensagem ser carregada de palavras tipo "luz", "amor", "preces" e coisa parecida que tudo vale.
E mais uma vez isso serve de advertência,pois isso é muito perigoso. Afinal, se a mensagem não for do espírito a que se atribui, pior para a comunicação entre mortos e vivos, porque os falecidos podem estar fazendo outra coisa no plano espiritual,até aprendendo como se comunicar,ou nem estão aí para isso, outros que se passam por eles já lhes passaram a perna e mandam mensagens por aí.
E tudo fica mais estranho ainda quando há clichês religiosos, numa pieguice que nem sempre é típica da personalidade do falecido. Pelo que se observa no padrão de mensagens espirituais divulgadas no Brasil, dá-se a falsa impressão de que, após o falecimento, as pessoas necessariamente se convertem em beatos religiosos. O pior de tudo é, para quem está começando no espiritismo,é deparar com uma situação refletiva dessas e não seguir a doutrina.
Esse panfletarismo religioso pode ser muitas vezes da imaginação religiosa de supostos médiuns ou dos espíritos que lhe cercam, porque nem todo mundo do "lado de lá" vai falar que vive "numa boa ou que estão numa esfera de luz" e que está bem por causa "das bênçãos e das preces enviadas por entes queridos".
Na verdade, muitos espíritos simplesmente manteriam o estilo de mensagem que tiveram em vida e dirão as sensações que tiveram, sem necessariamente apelar para clichês religiosos. Ou alguém esperaria que até Redson, da banda punk Cólera, viesse dizer em mensagem espiritual algo tipo "irmãos, estou feliz por receber as graças das vossas preces de luz que me confortaram a alma"?
Por isso, é preciso muito cuidado. O risco de levar gato por lebre é enorme. De repente, aquele ente querido que acreditamos ter mandado mensagem para nós não é realmente o autor dessa mensagem, e isso fica pior. Porque a verdadeira comunicação com os falecidos fica comprometida, quando outra pessoa se passa por algum finado para mandar "mensagens de amor e paz".
A falta de verificação de aspectos de personalidade, e a simples sedução que fazem as mensagens "carinhosas" de "luz e fraternidade" são verdadeiras armadilhas que poderão trazer dor e desilusão no futuro.
Antes de alguém se render aos encantos das "mensagens amorosas", seria melhor um pouco mais de observação e pesquisa quanto à natureza da mensagem enviada, para evitar problemas sérios.
Adaptação de
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